Plano aberto. Pai e filha caminham até a praia em um dia nublado. Atravessam o asfalto, tiram os chinelos e se sentam na areia, a poucos metros do mar agitado. Quietos, observam o horizonte e sentem os respingos d'água carregados pelo vento. Plano fechado nas costas de ambos, voltados para o mar. Close em suas mãos e seus pés. Começam a mexer na areia usando galhinhos perdidos.
Plano médio em ambos, ainda de costas, com troca de câmera de um para outro. Ela se vira para o pai e pergunta:
-- Por que você escolheu uma praia com mar tão revolto para construir a casa?
-- Gosto daqui. Sempre gostei desses lados do Balneário.
Plano médio em ambos, de frente para a câmera. Ouvem-se apenas o assovio do vento e os tapas das ondas na areia. Ela olha em direção à câmera com os olhos semicerrados, como se quisesse alcançar o horizonte. Close frontal nos dois. Ele a observa. Seus olhos, marejados, desviam rapidamente quando ela se volta para ele.
Troca de câmeras durante o diálogo. O pai conversa para conter as lágrimas.
-- Converso muito com os pescadores daqui. As pessoas são simples. Gosto disso.
-- Você se acha simples?
Ele ri sem jeito. Não responde. Silêncio. Apenas os dois estão na praia. Ela joga areia para frente com um galho. O galho escapa e a areia cai no tornozelo dele. Ele empurra areia com o pé para cima do pé dela. Ela enche as mãos de areia e joga nos joelhos dele. Eles riem. Riem e começam a jogar areia um no outro como duas crianças. Levantam-se, brincam de pegar, às gargalhadas.
Seus risos tomam conta da praia, sobrepondo-se ao barulho das ondas e dos ventos. O plano se abre e engrandece a cena, misturando todos os sons: do mar, do vento e dos risos. Ambos se jogam no chão enquanto a câmera se aproxima e, em plano médio, enquadra pai e filha emoldurados na areia, exaustos e arfantes.
Olham-se, ainda deitados. O pai faz um convite.
-- Quer jantar?
-- Sim.
-- Vamos, está escurecendo.
Ele se levanta. Estica o braço para ajudá-la. E voltam juntos para casa, sujos de areia, abraçados, introspectivos e com os olhos marejados. Cada um pensa consigo quando teria sido a última brincadeira de ambos na areia antes dos 17 anos de distância. E sorriem ao sentir que a saudade é capaz de trazer à tona sentimentos que pareciam esquecidos.
quarta-feira, 22 de abril de 2009
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Um comentário:
Mas essa cena foi!!! Do contrario, nao poderia jamais ter sido descrita com tamanha acuidade! Foi, foi nem que seja num plano diferente do que estava nos seus planos!
Abraco,
Elis
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