sexta-feira, 11 de dezembro de 2009


"Posso muito bem viver sem um amor", disse ele encarando-a com raiva, como que lutando contra um sentimento intrínseco de vulnerabilidade -- ao mundo, às coisas, a tropeções na calçada em dias de tédio, a ela. "Posso muito bem viver só", enfatizou. Ela não havia perguntando nada. Nem pedido. Apenas queria estar com ele. O que poderia acontecer, viessem os tropeções que viessem, independeria da vontade de ambos de controlar o mundo. Ele giraria sempre ou até o apocalipse, que até então só se concretizava nos filmes de ficção. "Por que não me diz o que sente?", perguntou ele, como quem pedia moeda de troca. Prolixa foi o que ela foi. Porque sua resposta era a indefinição. Não havia um porque, mas o que a movia até ele. Era nisso que ela via todo o sentido, embora não soubesse explicar. "Não preciso de um amor para viver", repetiu ele. Seu olhar era triste. Triste como o de quem pedia um abraço nunca tido. Triste como o de quem dizia exatamente o oposto, mas não acreditava ser possível. Não nessa encarnação. Se é que encarnaríamos de novo. Ela ficou pensando no significado daquilo tudo. No porquê de seu encontro ter se transformado no questionamento do amor. Afinal, amor se pensa ou só se sente? O que a movia até ele, então? Sabia que existia algo, mas não sabia o nome. Nem discursar sobre. A conversa não terminou porque não havia fim. Nem começo, nem recomeço. E sim, algo sem gosto nem forma. Paladares e tatos e vozes e aromas de ambos que, juntos, eram. E bastavam, explicavam-se por si. Restou a ela pegar as malas e ir embora, certa de que faria tudo de novo.

2 comentários:

Anônimo disse...

Os frutos da despedida...lindos, suculentos. As palavras ficam gravadas, sem endereço ou destino. Ficam.

SRTA. LÓRI CAPITU disse...

"Não preciso de um amor para viver", ele disse. Mas que bom que você escreve para me eternizar nesse fragmento de protoamor que me oferece assim... tão humanamente.

(Pois é, nem tudo é tão sagaz nessa vida.)